A maior discussão atualmente no futebol brasileiro, diz repeito aos métodos de treinamento. Quando vemos o Barcelona jogando, com todos seus princípios bem definidos, com a sua efetividade de seu modelo de jogo, e principalmente a qualidade dos jogadores formados dentro do próprio clube. Mas aqui no Brasil, aonde temos um contexto bem diferente do espanhol, uma cultura de jogo diferente, um aspecto social cultural totalmente distintos e o que para mim é o principal ponto, o tempo em que o processo de treinamento já vem sendo aplicado no Barcelona. Não se muda uma cultura de uma hora para outra, não se muda comportamento da noite para o dia, por isso precisamo de uma mudança gradual, encontrando um equilíbrio entre os fatores envolvidos para a performance, como táticos, técnicos, físicos e psicológicos.
Temos historicamente três tendências metodológicas ao longo do processo de treinamento do futebol, a originária do leste europeu que tem por característica a divisão por períodos, picos de performance, em determinados momentos competitivos. A segunda surgiu na América do Norte e Norte Europeu que direcionava seus objetivos em capacidades físicas, dividindo-as separadamente. Estas duas tendências metodológicas misturam-se em alguns momentos, e podem ser denominadas de Método Analítico, que propõem uma divisão por partes de um contexto geral. A terceira tendência vem trazendo a integração das partes, física e técnica, surgindo na América Latina o treinamento integrado que buscava em trabalhos físicos, com o uso da bola, a exigência encontrada no jogo. A última tendência metodológica, que tem como berço Portugal, denominada Periodização Tática, que tem por objetivo principal uma forma de jogar, baseada em princípios de jogo, que claro, prioriza em todos os sentidos a questão tática. Procura em todos os momentos do treino, um entendimento tático da forma de jogar, e dentro destes trabalhos táticos encontra-se os aspectos técnicos, físicos e psicológicos.
Atualmente o entendimento do jogo, as questões relacionadas ao modelo de jogo, inerentes ao entendimento dos jogadores a uma cultura do jogar. Aonde o mais importante é distribuir no tempo a aquisição de comportamentos táticos (princípios e sub-princípios) e estratégicos inerentes a uma determinada forma de jogar, com base em um modelo de jogo atual, com subjacentes arrastamentos das dimensões físicas, técnicas e psicológicas. Entende-se por modelo de jogo um corpo de idéias, relacionados como uma determinada forma de jogar, constituindo assim como um “perfil” de jogo da equipe (GRAÇA e OLIVEIRA, 1994).
A principal barreira da Periodização Tática no Brasil, talvez seja o vínculo cultura que temos com as questões físicas, e com a necessidade que criamos e de termos números concretos, valores de performance, de onde estamos e aonde podemos chegar dentro de um universo físico, e até, aonde estes marcadores puramente biológicos podem contribuir para o sucesso coletivo?
De forma geral podemos dizer que metodologicamente o futebol até hoje é trabalhado sobre três bases metodológicas, que em alguma parte da história foi estudada, analisada e também vencedora, e por isso tornou-se referência, ou melhor, tendência por determinado tempo.
Marisa, 2006 sita Morin (1997) que se refere a sistema, como um todo, constituído pela relação de seus constituintes. Neste segmento, o “jogar” expressa às relações de cooperação entre os colegas e de oposição com os adversários. De acordo com esta concepção, o jogo é um sistema de “sistemas”. Quando falamos em sistemas a mesma autora, fala em globalidade, interação, organização e finalidade.
Mas até aonde o sistêmico abrange todos os requisitos do jogo. Ou melhor, até aonde o analítico pode contribuir para a performance do todo. Ou será que para obter uma metodologia mais próxima do ideal teremos que “integrar” o analítico com sistêmico?
Mas e a performance no futebol? Como temos o melhor resultado? Bom, talvez não se chegue a esta resposta, mas precisamos entender todas as linhas metodológicas para poder assim, construir não só uma forma de jogar, mas sim para uma maneira de aplicar nossas idéias sobre futebol.
Mesmo com inúmeras pesquisas sobre o esforço físico requerido no futebol, ainda hoje encontramos divergências entre os autores sobre este assunto. Isso se dá particularmente pela diversidade de movimentos envolvidos durante um jogo de futebol. Durante uma partida um jogador realiza cerca de 1000 atividades diferentes, com uma pausa em média de 6s, essas atividades abrangem trocas de direção e ritmo (agilidade), exercícios de habilidade de jogo, e na perseguição aos adversários dentro do jogo (REILLY, 1976 apud REILLY, 2000). O Treinamento no futebol deve refletir a variedade de movimentos que englobam uma partida (GODIK, 1996). Rui Faria, treinador adjunto de Mourinho a vários anos, disse certa vez em uma entrevista que na Periodização Tática não existe jogador com baixa capacidade física, ou mal preparado fisicamente, mas sim, apenas jogadores não adaptados ao modelo de jogo da equipe.
Garganta e Pinto em 1994 já afirmavam que ao longo do jogo de futebol, os fatores de natureza técnica revestem-se de extrema importância, pois são eles que permitem ao jogador responder aos problemas táticos decorrentes do próprio jogo, o futebolista utiliza uma vasta gama de recursos motores específicos, genericamente designados por técnica. Entende-se por modelo de jogo um corpo de idéias, relacionados como uma determinada forma de jogar, constituindo assim como um “perfil” de jogo da equipe (GRAÇA e OLIVEIRA, 1994).
Mas alguns cuidados devem ser levados em consideração quando se trata de uma mudança, ainda mais com mudanças metodológicas, toda mudança quando é feita de forma rápida, radical ou brusca, os resultados são instáveis, e como uma mudança de comportamento requer tempo, para que se torne um hábito, os resultados podem não aparecer a curto ou em médio prazo. Casarin (2010), diz que, quando um treinador chega a um clube, além de analisar sua condição física-estrutural-planejamental (materiais, campos, recursos financeiros, competições), observa seus jogadores e pensa na melhor forma de pô-los a jogar (sua concepção de jogo) em cima da cultura de futebol do clube. Essa é a lógica. Certo ou errado? Errado. Poucos dos nossos clubes e treinadores respeitam suas questões históricas e culturais, e a cada semestre modificam sua forma de jogar, não adquirindo uma cultura de clube necessária para criar uma identidade futebolística. Essa constatação é um dos vários “cancros” do nosso futebol e acaba refletindo nas categorias de base.
Quando falamos na mudança metodológica, temos que levar em consideração que a parte tática no Brasil, precisa sofrer uma evolução, o desenvolvimento tática não acompanhou a evolução de outras áreas, como a preparação física, medicina esportiva, fisioterapia, nutrição e psicologia, além de todo o aparato tecnológico que norteia toda essa evolução. A periodização tática, a meu ver, traz essa evolução tática que o futebol brasileiro precisava, mas sem a marginalização das outras áreas. Silva e Floriano, 2010, nos trazem a idéia de que o treinamento físico especifico atualmente se divide em dois momentos, o primeiro é que o treinamento físico não está mais desvinculado do contexto do jogo, ou seja, o “físico” está auxiliando no cumprimento de uma tarefa técnica, que por sua vez está resolvendo um “problema” tático, que por sua vez necessita de um físico para se expressar enquanto ação; assim é inconcebível pensar no físico desvinculado da intenção tática. No segundo momento, o treinamento dito “físico” pode ser pensado enquanto meio auxiliar de preservação do “agente” responsável por executar uma ação que já se estabeleceu previamente no sistema cognitivo.
Mas até onde trabalhos analíticos podem trazer benefícios ao modelo sistêmico? Quando falamos sobre isso, temos que nos reportar ao entendimento do jogo, na capacidade que atleta/jogador tem de identificar, analisar e executar uma ação, que é feita sobre uma escolha. Alguns autores trazem que quando o atleta/jogador chega a um determinado nível de fadiga essas escolhas são prejudicadas. BertolassiI, 2007 diz que para executar uma resposta motora de maneira satisfatória dependemos em grande parte do tempo disponível entre a pista visual e a resposta, pois além da programação motora, uma resposta adequada exige também o ajuste temporal dos movimentos. No futebol este tempo, entre a pista visual e a resposta motora, é curtíssimo. O mesmo autor traz que atletas com menor fadiga apresentam resultados melhores quanto a resposta motora e tomada de decisão. Bertolassi, nos mostra esses resultados em um teste visual, em um computador. Então, em um contexto de jogo, ainda temos outros fatores a serem considerados, como velocidade e trajetória da bola, adversários, vento, luz. Então esse decréscimo deve ser ainda maior, pois o número de fatores a serem considerados também é maior.
O que não podemos esquecer é a individualidade de cada um de nossos jogadores, e vê-los dentro de um contexto geral, montar nosso modelo de treinamento, seja ele analítico, integrado ou sistêmico. Pois a meu ver só podemos construir um método de treino após conhecermos todas as necessidades do nosso grupo de trabalho. Claro que cada comissão técnica tem seus princípios, e conceitos, que se repetem ao longo dos treinamentos, mas a formação de uma equipe deve passar principalmente pelas características individuais, e depois, montar um modelo de jogo aonde essas individualidade possa funcionar para o sucesso do todo.
Mais uma vez fica claro que devemos buscar dentro de cada método o melhor para determinado grupo. Devemos ter um grupo com um bom entendimento tático, com boa condição técnica, e níveis físicos satisfatórios para suportar as exigências do jogo, sejam elas físicas ou psicologias. E para isso não podemos esquecer do indivíduo como um todo, que pensa, que interpreta e executa ações, e para isso precisa estar biologicamente e psicologicamente apto para tudo.