terça-feira, 6 de setembro de 2011

Não devemos caricaturar o Barcelona, devemos entender o processo e conhecer nossa realidade





 acesso em http://fcbarcelonacaricature.blogspot.com/2010_10_31_archive.html
    A cada rodada que o time do Barcelona está em campo fica claro que não se trata de time comum, pois apresenta uma série de características que normalmente não são encontradas em nenhum outro time no mundo. É evidente que sua posse de bola é marcante, sua transição defensiva que acontece a partir do momento da perda da bola, principalmente quando esta acontece no campo do adversário, a posse de bola objetiva, sem medo do erro, criando e utilizando espaços, a eficiência da posse de bola com passes transversais e não apenas aquela troca de passes entre zagueiros e volantes que vemos quando se tenta copiar o modelo espanhol.  
          O fenômeno Barcelona é tão grande que revolucionou a própria seleção espanhola, que na sua história era conhecida apenas pela garra, força, imposição física e pela marcação, ficando conhecida com “La Furia”. A partir dos anos 90 o Barcelona começa a ganhar status de super time, com a volta de Cruyff ao Barça depois de uma série de títulos no Ajax. Cruyff plantou na equipe catalã a filosofia que depois caracterizaria o clube, a valorização das categorias de base. O clube seguiria a receita mesmo após a saída do treinador, e hoje sua academia conta com doze equipes, cada uma com até 24 jogadores. Os técnicos são licenciados pela UEFA para dirigir as categorias inferiores do Barça, consideradas as maiores produtoras de jogadores de alto nível, chegando a levar até 15 anos para formar um atleta. Josep Guardiola, Albert Ferrer, Carles Busquets, Thomas Christiansen e Sergi Barjuan, foram todos garotos levados diretamente por Cruyff ao time principal. Guardiola sintetizou a ideologia de seu ex-treinador, seguida até hoje pelo clube:

"os jogadores têm de pensar rápido e jogar com inteligência, sempre sabendo qual será o próximo passe (…). É assim que aprendemos a jogar e que o público espera que joguemos: de forma atraente, mas sem perder a eficiência (…). Cruyff (…) nos ensinou a jogar movimentando a bola rapidamente. Ele só usava jogadores de grande técnica. Quando procuramos por jogadores, ainda queremos essas qualidades”
Guardiola
Não podemos falar da filosofia Barcelona sem falar de “La Masia”, nas paredes desta casa há fotografias de pequenos jogadores, equipes, memórias de um passado recente que marcam a atualidade do futebol. As feições de criança não enganam e da turma de 1996 podemos identificar Iniesta, Valdés, Pepe Reina e Puyol, todos eles campeões do mundo na África do Sul. Em La Masia os  garotos de 14 a 18 anos, recebem todas as condições para um desemvolvimento, primeiramente intelectual, e depois, também, futebolístico para chegarem ao objetivo final, que é o time profissinal. A sede original que formou os craques sitados acima, ficava localizada ao lado do campo de treinos da equipe principal, e poucos metros do Camp Nou, criando assim uma atmosfera única, aonde o sonho é concreto e está logo alí a frente, personalizado em atletas como Messi, Puyol, Xavi e cia.

   Xavi, símbolo de uma filosofia de futebol disse a Equipe Universidade do Futebol em 2010. “ Eu tinha 11 anos quando aqui cheguei, e a filosofia futebolística deste clube foi incutida em mim desde o início. O mais importante nesta fase é a vontade de aprender. A filosofia é a de que o resultado é o que menos interessa", disse o meia.

     No II Seminário de Futebol, realizado no Grêmio Foot-Ball Porto Alegrense com a parceria da Escola de Educação Física da Universidade Federal do Rio Grande do Sul, tivemos a explanação de Nuno Amieiro, ex-técnico adjunto do FC Porto, especialista em alto rendimento pela universidade do Porto, falou sobre a construção de um modelo de jogo.  E Jordi Melero Busquets, ex-jogador do Barcelona e atual gerente de prospecção do Barcelona na América do Sul. Este falou sobre protocolo de avaliação de jogadores. Ambos, a sua maneira, deixaram claro que o processo de formação de uma equipe vencedora passa pelo planejamento a longo prazo, e pelo processo de continuidade. O clube segue um padrão para cada posição dentro de campo, cada uma das posições tem, segundo o clube, características técnicas, físicas e psicológicas distintas. Como disse Jordi ao público no seminário, o Barça tem um Xavi em cada categoria, tem um Iniesta em cada nível. E essas características servem de leme para a captação de jogadores que acontece em países também já mapeados pelo clube espanhol.

   Dentro do clube, a metodologia também é um diferencial, todas as categorias apresentam a mesma forma de jogar, a mesma metodologia de treino, que visa o desenvolvimento cognitivo dos jogadores dentro de uma realidade de jogo baseado nos princípios do modelo de jogo do Barcelona.

     O Barcelona de Messi, Xavi, Iniesta, Puyol e outros, joga a Barcelona no mínimo a 12 anos. Isso aliado com um perfil de jogador, com ótimo nível de concentração e comprometimento, somado a uma cultura européia aonde a ideologia de um garoto de 15 anos, é totalmente diferente de um jovem da mesma idade no Brasil, leva o clube catalão a abrir mão de preocupações para poder centralizar seus objetivos na problemática tática. Um jogador espanhol que passou por um processo de seleção adequado, que passa por uma cultura de jogo consistente, que não muda de dois em dois anos, que não tem sua individualidade rompida pela necessidade de vitória de um treinador que só pensa em sua auto-promoção, tem uma capacidade maior de absorver o treinamento do que um jogador que não está inserido nessa atmosfera propícia para o desenvolvimento gradual de todos os aspectos, técnicos, táticos, físicos e psicológicos.

    Segundo Xavi ao Universidade do Futebol, os benefícios para a equipe principal do clube são evidentes. “Jogar de forma inteligente, passar para o pé direito de um jogador destro, ou para o esquerdo de um canhoto. Antes de receber a bola, já saber o que fazer com ela. Podem ver o resultado desse desenvolvimento, com oito ou nove jogadores-chave da equipa principal do Barcelona oriundos dos escalões jovens. Formam a base sob a qual a equipe é construída", declarou ainda em entrevista ao site.

Acesso em http://mariomarcos.wordpress.com/2011/05/04/a-arte-do-gonza-ii/
  Comentário de Cruijff após a vitória do Real Madri sobre o Barcelona da Copa do Rei de 2011. Afirmando a importância de se fazer o que se sabe fazer “Logo de entrada deve esquecer-se das batalhas dialéticas e quezílias. Não é o seu estilo, e aí perderá sempre. Deve trocar a bola o máximo de tempo possível, e da forma mais simples. Isso passa pelo mais básico. Um toque é sempre melhor que dois. Mais velocidade na circulação de bola, com maior concentração e mais linhas de passe. Não devem preocupar-se com quem é o árbitro, nem se a relva está alta. Devem preocupar-se com a profundidade, algo em que o Villa é fundamental. Sem profundidade o jogo estreita, e há mais perdas de bola e conseqüentes contra-ataques”. Ele deixa claro que quando se foge de uma característica tão inerente ao clube, perde-se não apenas a identidade, mas sim os benefícios de uma cultura de jogo adquirida ao longo de muitos anos.

Bom, mais uma vez, entramos no dilema, como aplicaremos a metodologia vencedora do clube espanhol no Brasil, aqui, em nossa realidade, com jogadores com altíssimo nível técnico, mas com problemas táticos que às vezes parecem irremediáveis. Como resolveremos esse problema? Bom, talvez retirando totalmente os trabalhos físicos analíticos e/ou integrados. Será? Ou melhor, excluiremos os nossos talentos técnicos que por sua vez não tem o mesmo entendimento do modelo de jogo, pois estes por muito tempo receberam informações do tipo “vai dentro dele”,mas pode também cortar os zagueiros que não marcam a zona, pois estes também não tiveram os estímulos adequados pois é mais fácil “pegar o atacante até o fim”.

Enfim, não podemos mudar 50 anos de história e um ou dois anos de radicalismo, ainda mais quando nesses “50 anos” foram ganhos muitos títulos, e construiu-se uma história e formou-se uma cultura, mas podemos adaptar nossos treinos, para que a longo prazo possamos ter resultados mais consistentes. Por exemplo, o preparador físico, foi durante anos a referência científica dentro da comissão técnica, o crescimento da tecnologia, está sendo usada para o desenvolvimento dos parâmetros e controles físico, levou a predominância desta área sobre as demais em todos os métodos de treinamento.

Levando em consideração a grande maioria dos estudiosos do método espanhol, fica claro que o perfil e cultura da onde o jogador está inserido é fundamental e determinante para a definição do processo de desenvolvimento do método de treino. Tendo em vista que o próprio Barcelona, busca estas características de perfil em seus atletas mesmo na base. E juntamente com um processo de desenvolvimento adequado, individualizado a sua realidade, apresentando uma linha contínua de trabalho, aonde uma forma de jogar, baseada e princípios que são fundamentais os resultados são sem dúvida de estrema consistência.



Referências
http://www.maisfutebol.iol.pt/espanha/cruyff-barcelona-real-madrid-champions-league-maisfutebol/1248728-1486.html
http://espn.estadao.com.br/barcelona/noticia/211033_GUARDIOLA+CHEGA+A+12+TITULOS+SUPERA+CRUYFF+E+VIRA+MAIOR+VENCEDOR+DO+BARCELONA
http://www.universidadedofutebol.com.br/2010/10/2,14338,XAVI+ENALTECE+FILOSOFIA+FUTEBOLISTICA+DO+BARCELONA.aspx

3 comentários:

  1. Cada clube tem suas caracteristica e influencias, é admiravel a eficiencia do Barcelona em todos aspectos mas o irritante é a tentativa de "copia" do modelo de formação e outros. O Barcelona serve apenas como reforça do quão importante é voce ter uma "escola" de jogo e formação, assim como tem o Santos e o proprio Internacional. O Complicado é a cada novo diretor de base trocar a filosofia! Não faltam lunaticos para querer implantar modelos europeus agredindo a historia e "escola" de jogo do clube. Não devemos perder as caracteristicas, apenas aperfeiçoar e modernizar.

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  2. Olá Túlio, parabéns por sua inicativa com o blog,tens publicado muitas coisas boas por aqui.
    Suceso em tua carreira.

    Fabiano Piassarollo

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  3. Valeu Piassarollo, conto com todos para mantermos esse vinculo, que é saudável para todos, abraço

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