segunda-feira, 31 de outubro de 2011

O treinamento em futebol e os níveis neurológicos

Ao ler o texto do professor e amigo Eduardo Barros no site universidade do futebol, me identifiquei com a proposta do artigo, pois como profissional do futebol, e estudioso do mesmo tenho vivido tais dilemas e dúvidas a respeito desta mudança metodológica que o futebol mundial vem sofrendo. E concordo quando o professor Eduardo coloca que “novos comportamentos refletem em mudanças de ambiente, ou seja, do grupo de pessoas que formam cada um dos clubes do futebol brasileiro”. Mas o que difere neste caso é o quanto este ambiente quer ser modificado, pois vemos grandes trabalhos sendo realizados em pequenos centros de treinamento aonde o ambiente é mais favorável para tais mudanças. Aonde de repente a mudança de comportamento a nível neurológico possa ocorrer, justamente pelo meio.
Quem sabe para os grandes clubes, a mudança possa ocorrer de uma forma menos invasiva, gradual, aos poucos, para que não cause a estranheza do “sistema neurológico”. Uma forma gradual integrativa e não exclusiva. Como por exemplo, o grande conflito sobre as metodologias está quase que centrada na sistemática física, então o fácil é “cortar a parte física pura?”. Esse para mim é o principal erro, temos que integrar, unir, contextualizar, interdisciplinar, multidisciplinar as áreas, e não excluí-las.
Em resumo, parabéns Eduardo pelo texto, grande abraço.




Aproxima-se o fim de inúmeras competições pelo Brasil. Tanto nos campeonatos das categorias de base como nas competições profissionais, as próximas semanas serão de jogos decisivos. E estes jogos, físicos-técnicos-táticos-emocionais ao mesmo tempo, para todos os jogadores, durante os minutos que correspondem a cada partida, pedem treinamentos que contemplem as mesmas características do jogo, certo? Pelo que temos visto, errado!

Declarações, observações, leituras, imagens e reportagens variadas ilustram um cenário que precisa ser alterado mais rapidamente.

Trações, circuito com saltos e acelerações, corridas com mudanças de direção, finalizações descontextualizadas, saltos com pneu, táticos-sombra ou quaisquer outros treinamentos que privilegiem fragmentos do jogo (e não fractais), podem significar perdas de minutos preciosos em momentos, conforme mencionados, tão decisivos. Para estes momentos, leia-se a luta contra o rebaixamento, o acesso, o título, as vagas em competições importantes e, inclusive, a manutenção do emprego.

O dinamismo do mundo atual permite o acesso à informação, ao que é novo ou tendência, num intervalo de tempo consideravelmente pequeno. No futebol, o novo é treinar conforme se quer jogar. Barcelona, José Mourinho, Júlio Garganta, Porto, Claude Bayer, Rodrigo Leitão, Universidade do Porto, Vítor Frade, Ajax, Alcides Scaglia, André Villas-Boas são exemplos de pessoas e instituições que têm privilegiado e divulgado o que é atual.

Porém, por que mesmo com tanta informação disponível, a transformação está aquém da ideal?

Cada indivíduo interpreta a realidade de forma distinta. Diferentes experiências, aprendizagens, vivências e reflexões formam a visão de mundo de cada ser humano, que pode ter maior ou menor capacidade de mudança.
Alguns estudiosos do comportamento humano afirmam que gerimos a mudança (e todos os nossos pensamentos) a partir de seis níveis neurológicos: ambiente, comportamento, competências, crenças/ valores, identidade e espiritualidade.

A interpretação da realidade considerada neste texto será a do treinamento em futebol que, de acordo com todo o material científico que se tem conhecimento, pode ser desenvolvido a partir de um viés tecnicista, integrado ou atual (sistêmico).

O ambiente significa o local em que cada indivíduo atua. Traduzindo para o treinamento em futebol, corresponde a cada clube, formado por um determinado grupo de pessoas.

O comportamento compreende as atitudes efetivas de cada pessoa em um determinado ambiente. Em relação ao treinamento, tais atitudes se referem à maneira que é operacionalizado o processo de desenvolvimento de uma equipe.

Já as competências significam o conjunto de habilidades que cada indivíduo possui e que refletem o modo como o mesmo aplica seus conhecimentos. Para o exemplo deste texto, traduz o que o indivíduo sabe e o quanto se capacita.
E, por último (afinal não será abordada a identidade e espiritualidade para não parecer demasiadamente utópico), o treinamento em futebol segundo as crenças e valores. Neste nível neurológico, a interpretação da realidade se dá de acordo com o que a pessoa acredita, com seus princípios e com suas verdades.

Posto isso, é possível afirmar que a transformação está aquém da ideal, porque pouquíssimos indivíduos que atuam com o futebol conseguem gerar mudanças efetivas no nível neurológico das crenças e valores.

Toda informação disponível tardará para ser, de fato, uma transformação do futebol brasileiro, enquanto as intervenções ocorrerem somente nos três primeiros níveis neurológicos.
Diversos ambientes não permitem uma troca harmoniosa de conhecimento entre os seus integrantes e enquanto treinadores acreditarem que vencerão seus jogos simplesmente porque estão há muito tempo na bola e conhecem o meio, a transformação será atrasada.

O comportamento predominante do treino em futebol não converge para todas as sessões diretamente relacionadas com a ideia de jogo do treinador e assim permanecerá enquanto os preparadores físicos crerem que são necessárias sessões exclusivas para o desenvolvimento de potência, capacidade aeróbia ou resistência específica.

Leituras sobre periodização tática, complexidade, teoria dos jogos, ensino dos JDC e princípios táticos do futebol não irão para a prática, ou irão menos do que poderiam, enquanto forem verdades absolutas para as comissões técnicas, as experiências adquiridas tanto de caráter empírico ou científico.
Mas, se cada indivíduo, não só para o treinamento em futebol, mas para a vida, decidir ampliar sua reflexão, discussão e busca de conhecimento (e autoconhecimento), as mudanças emergenciais serão mais rápidas.

Transformar crenças e valores não é fácil! Os mesmos estudiosos do comportamento humano afirmam que quanto mais alto o nível neurológico, mais difícil é a mudança. O certo é que não há mudança de crença sem tentativa, sem risco, sem acertos, sem erros, sem novas experiências e disponibilidade para novas oportunidades.

Caso haja mudança de crenças e valores em cada indivíduo, consequentemente serão re-significados os três níveis neurológicos inferiores.
Quando a interpretação da realidade para o treino de futebol estiver fundamentada numa perspectiva sistêmica, a sede pela aquisição constante de novas habilidades transferirá todo o conhecimento teórico já existente para a realidade prática.

Com novas competências, derivadas de crenças e valores transformados, novos comportamentos serão observados, pois os anteriores perderão o sentido.

Finalmente, novos comportamentos refletem em mudanças de ambiente, ou seja, do grupo de pessoas que formam cada um dos clubes do futebol brasileiro.

Existem diferentes maneiras de cada ser humano modificar suas crenças: pode ser procurando ajuda, se conhecendo, estudando, conversando, ou de qualquer outra forma que permita um exercício frequente de reflexão.

Para você que já crê no que é atual em relação ao treinamento em futebol, faça sua parte com as competências e comportamentos adequados nos ambientes em que você atua. Já para aqueles que não crêem, não esperem o ambiente e o comportamento dos outros mudarem para você fazer o mesmo, pois isto pode não resolver se suas crenças permanecerem imutáveis.

Enfim, para todos os casos, a mudança só depende de você! Em que nível neurológico você está em relação ao treinamento em futebol?

Às vezes, para falar de futebol é preciso falar de pessoas...

Eduardo Barros
Graduado em Educação Física pela Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP), em 2008; especialista em Administração de Empresas pela Fundação Getúlio Vargas, em 2009.
Ex-atleta profissional de futebol no Brasil (AAPP e União Barbarense) e na Argentina (Huracán- TA) decidiu abandonar a carreira de atleta precocemente por insatisfação quanto a seu desempenho e consciência de suas diversas deficiências oriundas da formação.
Atualmente é Treinador Adjunto da Categoria sub-17 do Paulínia FC, em que trabalha desde 2007. No Paulínia, já atuou como professor do Projeto de Iniciação ao Futebol (PIF), como auxiliar técnico das Categorias Sub 12 e 15, além de Treinador das Categorias sub-12 e 13. É membro do Departamento de Pedagogia, sendo um dos responsáveis pela elaboração do Currículo de Formação do Atleta, material interno desenvolvido para todas as Categorias do Clube, do sub-11 ao sub-20.

Acessado em: http://www.universidadedofutebol.com.br/2011/10/3,11615,O+TREINAMENTO+EM+FUTEBOL+E+OS+NIVEIS+NEUROLOGICOS.aspx
 
 
 

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