quinta-feira, 15 de setembro de 2011

Intensidade! Um Conceito Abstrato?


Intensidade de jogo, um conceito que pode ter vários significados, dependendo da metodologia empregada pela comissão técnica. Podemos ter a intensidade medida, mensurada pelo lactato, pela Creatina-Kinase durante e após treinos e jogos. Mas temos outras intensidades, como a intensidade psicológica sofrida  pelos atletas. A intensidade quando relacionado ao aspecto físico dos atletas já está muito bem esclarecida. Temos hoje em dia vários métodos para saber se um treino, ou um jogo foi intenso para cada um de nossos jogadores.

Essa medida pode ser subjetiva, como o questionário de BOMPA, que avalia o estado de recuperação dos atletas em, 12, 24, 36 ou 48hs após o jogo, ou ainda um controle diário através da Escala Subjetiva de BORG. 
Para times com maior estrutura, a medida pode ser direta, dai podemos ter o Lactato como controle de treino, assim como a própria glicemia. Outras técnicas mais avançadas e que aparecem com frequência nos grande clubes é o controle de CK (Creatina-Kinase) um marcador de estresse muscular. A CK é exclusivo do meio intramuscular, e quando encontrado em grande quantidade na corrente sanguínea nos mostra que tivemos  um grande número de micro-lesões musculares, e que se não for observada com atenção pela comissão pode vir a se tornar um grave lesão muscular. Temos também o exame de urina, que nos mostra uma resposta rápida sobre processo catabólico, níveis de sódio e potássio e também a nível de hidratação em que o atleta está no tempo da coleta, que pode ser realizada 12, 24 ou 48 horas após o jogo.
Bom, mas uma vez, esses dados me levam a crer que a evolução sofrida pela parte física no futebol, é sem dúvida maior que na parte técnica e tática, uma vez que quando não se tem métodos de treino, não se tem objetivos para treinas. Por isso achei muito pertinente o artigo do professor Carlos Carvalhal, que mostra uma ideia de intensidade, relacionado a complexidade do jogo, que também refletirá em respostas metabólicas, pois acontecem dentro de um indivíduo que identifica, analisa e executa tarefas, tudo isso gerenciado por um fator psicológico.
Uma boa leitura a todos. 

É comum ouvirmos a palavra Intensidade. São várias as expressões que fazem parte da linguagem do futebol em que a palavra Intensidade está presente: “O jogo foi muito intenso”, “a minha equipa não teve intensidade”, “aquele jogador é muito intenso”, ou ainda “aquele não tem intensidade para jogar a este nível”. Mas então o que será isto de “Intensidade”?
Ao analisarmos o significado da palavra “Intensidade” no dicionário de língua Portuguesa podemos verificar que a noção de intensidade física é aquela que melhor esclarece o que habitualmente se diz sobre este tema, “Em física, a intensidade de uma fonte ou onda mede a variação do fluxo de energia no tempo…”. Ao analisarmos o significado da palavra “intenso” podemos ler: “que tem muita força… veemente, forte”.
Então o que é Intensidade no jogo de futebol? A variação de fluxo de energia no tempo como nos diz a noção da Física?! E um jogador ou jogo intenso? É aquele que tem muita força ou que é muito rápido?
É comum vermos uma equipa entrar a pressionar muito o adversário nos primeiros minutos e ouvirmos dizer que esta está a jogar com elevada intensidade! Será assim? Muitas vezes o que eu vejo é uma pressão “cega”, puramente emocional e desprovida de organização com muitas corridas sem sentido. Não raras as vezes ouvimos posteriormente o comentário, “a equipa entrou muito intensa e depois quebrou na segunda parte”. Será isto intensidade?
Estou em crer que esta noção aparece num sentido abstracto! Diz-se que é intenso quando se corre muito, quando se luta muito, quando se é agressivo! No fundo, utiliza-se esta palavra com uma conotação meramente “física”, associada principalmente à força e velocidade!
Levantemos as seguintes questões: O Barcelona possui em cada jogo uma elevada posse da bola, não será então uma equipa intensa? Uma equipa em posse da bola não poderá e deverá ser intensa? E para circular a bola com eficácia será preciso ser muito rápido de pernas e ter imensa força?
Lembro-me de quando fiz o meu estudo monográfico ter levantado a seguinte questão: é mais intensa uma corrida de 50 m em corrida livre à máxima velocidade ou uma corrida na mesma distância com uma bandeja com dois copos de água em que para venceres não podes deixar cair a água do copo? Para alguns consideram a primeira, porque se reportam meramente ao “físico”, para mim claramente que é a segunda, porquê? Porque tens que dar o teu máximo com uma dificuldade adicional que te vai exigir muito a nível da concentração. No fundo essa dificuldade vem pelo aumento da complexidade da tarefa. Mudou-se o critério de desempenho, aumentou-se a complexidade logo aumentou-se a intensidade.
Chegamos a um ponto importante da nossa reflexão, o critério de desempenho!
Não existe só um Futebol, existem muitos “futebóis”! O Benfica joga diferente do Porto, O Barça diferente do Real Madrid, a Argentina diferente do Brasil. Da ideia teórica que cada treinador tem na sua cabeça, procura reflexo na prestação em cada jogo. Para que isso aconteça, modela a sua equipa de acordo com os exercícios Específicos que preconiza! Esta escolha representa um determinado critério que lhe vai conferir uma determinada identidade.
Os jogadores no Jogo expressam esse critério de desempenho, tentando realizar as acções procurando eficiência e eficácia respeitando uma determinada forma de jogar. Ora aqui está o cerne desta questão, estas escolhas de acordo com a filosofia do treinador são extremamente complexas a partir do momento que se busca eficiência e eficácia. São complexas porque são colectivas e obedecem a um critério colectivo, ao envolver um número elevado de elementos (11 jogadores jogando contra 11) torna as acções mais complexas.
Procuremos um exemplo prático: A posse de bola do Barcelona é na minha opinião extremamente intensa! Ela é intensa porque tem critério de desempenho ofensivo (ter a bola muito tempo de forma a desorganizar o adversário) e dentro desse critério é eficiente e tem eficácia! Os jogadores para respeitar o seu Modelo não precisam de correr muito nem de ter muitíssima força…
Imaginemos uma outra equipa que defende em bloco médio e que tem como critério de desempenho ofensivo procurar chegar rápido à baliza adversária com o menor número de toques possível e com 3 a 4 jogadores envolvidos nestas acções. O desempenho é intenso se existir para além do critério acima referido eficiência e eficácia nas acções.
Se me perguntarem qual dos dois exemplos tem mais intensidade? Dentro de uma lógica sistémica, claramente o do Barcelona! Tem mais jogadores envolvidos, mais tempo de elaboração das acções, mais exigência emocional logo mais complexidade.
A propósito de exigência mental e emocional! Vamos procurar um exemplo do nosso quotidiano: como se sentiram após um exame teórico? Sim, extremamente cansados … correram? Saltaram? Nem saíram do lugar, como ficaram então cansados?! Desgaste mental e emocional.
Este tipo de desgaste existe num jogo de futebol. Quanto mais complexidade, quanto mais se tiver que se usar o cérebro para jogar de forma a respeitar a nossa Ideia de Jogo, mais nos vamos cansar…
A máxima expressão da complexidade que podemos obter em treino são a simulação de um jogo pelo facto de termos em confronto onze jogadores contra outros onze! Quanto mais jogadores, buscando uma identidade de acordo como uma ideia de jogo, mais complexidade vamos ter.
Respeito todas as perspectivas, mas a intensidade que procuro e entendo para as minhas equipas é a da eficiência e eficácia em função dos critérios de desempenho que preconizo de acordo com a modelação que pretendo.

2 comentários:

  1. Olá Túlio

    Estive lendo a postagem e percebo, ou pelo menos tento entender o que tu escreveu e o que o Carvalhal escreveu nesta coluna dele.

    A Intensidade que ele defende é a intensidade de concentração em algo, é uma intensidade mais completa pois ela aborda me parece tudo, corpo por completo.

    Me parece que esta é a preocupação, ou uma delas na Periodização Tática, a Intensidade Máxima.

    E este conceito é bem complexo, pois de fato também é físico, pois o fisico esta relacionado ao jogo, mas não é uma intensidade de desgaste, ou de fadiga, como citado acima, com indicadores pós jogo e treino. Esta é a mensuração da intensidade do treino físico, normalmente urilizada por metodologias que usam essa dimensão como foco, o que não ocorre, me parece no caso do Carvalhal.

    Por isso que ele exemplifica a questão da corrida, livre e com copos, pela questão do aumento da complexidade da ação.

    Ou seja, quanto mais complexo, mais intenso para o jogador, pois exige mais "Intensidade Máxima de Concentração".

    Outra coisa interessante sobre essa intensidade, é que por ter também um lado fisico, necessita ser levada, no caso do treino, ao limite do rendimento, para que possa de fato haver adaptações orgânicas, seguidas de determinadas recuperações.

    Minha pergunta é, será que estes métodos como lactato ou outro do tipo conseguem definir a intensidade da equipe? se ela foi intensa no jogo baseada nos seus conceitos de jogo?

    Dou um exemplo, Barcelona.

    Será que o Barcelona irá apresentar índices de algum residuo metabólico, indicando fadiga pela intensidade, em níveis de média de outras equipes, respeitando, no jogo seus conceitos, sendo coerêntes com isso? Estando corporalmente habituados a isso?

    Ou será que irá apresentar índices de fadiga por intensidades, caso não respeite seus próprios princípios, e ai, certamente entrará em atrito, e irá gerar determinados resíduos orgãnicos que demonstram essa fadiga pela intensidade, mas não estarão sendo eles menos intensos do que deveriam ser caso respeitassem seus proprios comportamentos?

    Justamente ai encontra-se um dos erros de muitos treinadores que acompanhei. Treina-se determinados conceitos, e chegando na hora do jogo, se faz outra coisa.

    Exemplo: A equipe passa a semana toda treinando posse, longa, circulante, todo mundo circulando.

    Ai quando chega o jogo, a equipe circula 3 passes e se desfaz da bola, ou ao chegar em um dos zagueiros o mesmo lança sempre em profundidade, ou seja, não existe coer~encia entre o processo de preparação e o jogo, logo a intensidade física gerada pelas transições constantes acaba colocando os jogadores constantemente em acidose, e isso, no pós jogo em avaliações irá dar um resultado, que poderia ser outro se o treinador tivesse percurso e discurso afinados.

    Ai vemos a complexidade de se definir isso em formas mais lineares, pelo numero de variáveis que influenciam o assunto, de forma não-linear ao extremo.

    Acredito que o feedback do corpo, gerando determinados resultados em relação a fadiga acumulada, se existir, jogo á jogo, com avaliações como o CK ou a escala de Borg são importantes ( se a equipe vier, jogo à jogo, respeitando seu p´roprio modelo, isso é um indicador da rotatividade, o cansaço acumulado pela densidade competitiva, porém com coer~encia ao p´roprio modelo), para a geração de recuperação jogo à jogo, mas tenho dúvidas sobre o controle do treino, da intensidade do treino.

    Este seroia um controle quantitativo, pessoalmente acredito no controle qualitativo, que se baseia na eficiência e eficácia dos princípios que se demonstra no campo.

    Grande abraço
    Luis Esteves

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  2. Grande e importantíssima observação e explanação. Acredito que assim como a o aspecto biológico da suporte para o psicológico, a recíproca é verdadeira. A complexidade afeta diretamente em repostar químicas e bioquímicas. Mas esses controles são apenas acessórios para a performance. O que podemos pensar é que, será que os valores de lactato, CK, BORG do Barcelona estariam dentro dos valores de referência? Acredito que não, para estes, seriam outros valores, que se monitorados ao longo de um período poderiam sim contribuir em algum momento para quem sabe prevenir uma lesão por exemplo. Outro ponto que você coloca que acho primordial. O que se treina, se joga, se não treina com intensidade, complexidade, seu jogo não terá intensidade/complexidade. O fato de se jogar, com características diferentes do que se treina já causa um constrangimento ao jogador, e conseqüentemente refletirá no aspecto físico.
    Acho que temos que aproximar as idéias, e buscar um ponto de equilíbrio, entre o treinar e jogar, para que o jogo seja o menos "constrangente" possível, mas sempre o sera.

    Obrigado Esteves

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